sexta-feira, outubro 27, 2006

Aborto: Missão impossível


Na passada semana,a União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR) entregou uma queixa junto do Provedor de Justiça, na qual critica o Código Deontológico dos médicos, por ser "mais restritivo do que a lei penal" no que ao aborto diz respeito, e reivindica a sua adequação à lei em vigor. É que o código Deontológico é no fim de contas um "pau de dois bicos", pois se por um lado considera o aborto como uma "falta deontológica grave", por outro, já não considera grave a interrupção da gravidez quando está em causa a salvaguarda da vida do próprio doente...Confusos?...
No entanto, a lei em vigor vai mais longe e considera que o aborto pode ser praticável se houver seguros motivos de que o nascituro virá a sofrer, de forma incurável, de grave doença ou malformação, e se esta for realizada nas primeiras 16 semanas de gravidez; e ainda se a gravidez resultou de crime contra a liberdade e autodeterminação sexual e se for realizada nas primeiras 12 semanas de gravidez...ok, nada de novo...
O caldo começa a entornar quando a UMAR pede ao provedor uma adequação do código Deontológico à legislação em vigor...
Ora recapitulemos, de um lado temos a legislação que nos permite interromper voluntariamente a gravidez apenas em situações já acima referidas; do outro temos a ética médica que se "recusa" a fazê-lo, boicotando a anulando-nos esse direito...?!? E mais...diria que mediante os próprios poderes do Estado a Ordem dos Médicos pretendem com esta atitude exercer o seu poder com um fundamentalismo médico que já passou à história, baseado em éticas morais ultrapassadas e muito, muito subjectivas...ou seja, recusam-se pura e simplesmente em exercer um papel, a serem verdadeiros profissionais na medida em que, neste caso, se recusam a ser...médicos.
No final de contas, encontra-se por detrás do palco, de aplausos e avanços na medicina, um guardião ainda mais retrógrado que a própria lei penal hipócrita e criminalizadora.

Do outro lado da luta temos os movimentos pela despenalização de Interrupção Voluntária da Gravidez, patrocinada pelos "camaradas", que pretendem, resumidamente pressionar o poder político a aprovar uma nova lei, na Assembleia...a tal campanha pelo "sim" no referendo...isto, apesar de discordar da realização do mesmo...coisa que pessoalmente,concordo.
No entanto, este "movimento" contradiz-se a si próprio, pois se por um lado defende que esta decisão deve ser imediatamente aprovado em assembleia, ou seja, sem passar por um processo de referendo; por outro, tem como palavra de ordem a participação dos cidadão e cidadãs para intervir activamente em todo este processo de campanha pelo "sim" à despenalização...os leitores mais atentos ficarão um pouco confusos com tudo isto, diria eu...

A par de tudo isto a recém-criada Associação de Médicos pela Escolha vai promover um Encontro Nacional em Dezembro, para que os profissionais possam discutir a questão do IVG, defendendo o arranque de acções de formação em escolas e estabelecimentos de saúde sobre o tema, e ao entendimento entre esses profissionais num debate que dizem haver "mais enganos e equívocos"...até estes me parecem confusos...

É urgente que a IVG seja despenalizada, que a mulher possa exercer a sua liberdade de escolha neste assunto, pois trata-se desde há muito tempo de uma questão de saúde pública, de liberdade pessoal de escolha e acima de tudo de mais um passo no desenvolvimento pessoal e civilizacional desta pequena parte da Europa e do Mundo. Mas é igualmente urgente que as partes envolvidas colaborem, possam pôr realmente em prática um direito que nos é assistido e acabar com todas as lutas pelo poder decisório quando se põe em causa uma questão que temos "carregado" tão vergonhosamente às costas nestas últimas décadas e que agora parece finalmente ter um prazo de terminar.

Uma barragem à espreita


Um rapaz brinca nas margens do rio Brahmaputra, em Gauhati, na Índia. As autoridades locais têm-se manifestado contra a intenção do Governo central de construir uma barragem para fazer chegar água a províncias áridas, porque o Brahmaputra é o principal sustento dos habitantes de Assam e Arunachal.

Fonte: Público
Foto: Anupam Nath/AP

domingo, outubro 08, 2006

As Mulheres


Não pretendo com isto girar em torno da emancipação feminina, nem das desigualdades existentes entre sexos, nem das ameaças que teimam enfraquecer-nos, nem das raízes sexistas que já foram e continuam a ser o pilar em muitas civilizações (e aqui o grau de desenvolvimento social não influência o grau de “ignorância” nesta questão).
Quero depositar todas as minhas esperanças, quero acreditar na NOSSA força e determinação...sou MULHER e por isso vou esquecer todos os problemas que me inquietam, todas as situações reais e horripilantes que me queimam o sangue…Vou dedicar todo este trabalho às Mulheres e prestar-nos a Homenagem… Vou recarregar a minha alma, vou executar um ritual, vou quebrar barreiras, vou derramar-me e vou renascer… serei invencível.
Não serei por isso uma sonhadora, nem o quero ser tão absurdamente…porque sei que em Nós nem tudo é perfeito, nem o queremos ser…, os defeitos constroem-nos da mesma forma que as qualidades. Crescemos com todos os prós e contras, muitos contras, mas o resultado é sempre o mesmo - tornamo-nos Mulheres e por isso, com uma capacidade extra de força para lidar e ultrapassar as situações mais adversas.
Somos vida e temos a capacidade extraordinária de a conceber, somos Mãe Natureza, somos um habitat, somos o mundo, e criamos o começo… alimentamos paixões, amores eternos, e somos musas dos mais belos poemas…o Mundo muda à Nossa passagem. Somos as “enviadas” do AMOR na Humanidade, LUTAMOS por nós e por todos, marcando-nos dia-a-dia no rosto, na alma, marcas da intempérie, lembrando-nos de tudo o que já vivemos. Por isso somos também sofrimento, angústia e dor, sem ressentimento ou resignação…não nos culpabilizamos mas também não nos vitimamos…preferimos ficar, lutar, insistir, nunca desistimos…mas desanimamos com o facto de muitos não terem nascido com os nossos olhos – há os cegos e os que não querem ver... (Este último Handicap social não é “genético”, por isso…o que parece ser inofensivo e sem repercussões acaba por, mais tarde, ser usado contra nós próprias…).
Vivemos no dilema constante da vida de termos em nós o bom e o mau, o espinho e a rosa, o azedo e doce de sermos Mulheres…e aqui o mau, o espinho e o azedo se traduz no meio que nos rodeia, na realidade que nos confronta ao sermos rotuladas e tratadas como o sexo fraco…o nosso nome espalha-se sem valor e pronuncia-se sem respeito tanto pelo “macho” como até por algumas “fêmeas”…(ao utilizar estas expressões não quero ofender a espécie animal, mas somente enquadrar estas pessoas no quadro natural que lhes pertence – uma espécie em vias de extinção).
Propus-me inicialmente a não falar no que me inquieta, e por muito que eu tentasse não havia forma de contornar, é impossível, e sendo eu Mulher, não falar nisso. Continua e continuará a ser a preocupação central e a busca incessante das Mulheres na actualidade – acabar de vez com esta luta desenfreada entre sexos e ocupar o lugar a que temos direito nesta sociedade. Espero no entanto e com todas as minhas esperanças que num futuro próximo alguém seja capaz de escrever sobre as Mulheres sem ter de se inquietar e revoltar com a sua própria condição no mundo.
“Haviam de gostar de me atravessar com o olhar, mas nada é mais opaco do que a transparência absoluta.” A Mulher é um diabo, é uma deusa, é um desespero, é uma luz, é um anjo, é uma guerreira, é uma prisioneira, é um objecto, é uma célula, é uma perdida, é um coração, é uma melodia, é uma faca, é um aroma, é noite… a Mulher também sou eu e eu penso em ir pelas vias principais, não me meto em vielas, não me escondo, não vou dar a volta, vou sempre em frente e sou o que está à vista, estou aqui e não pretendo ir embora.

(Imagem de Beksinski)

sábado, outubro 07, 2006

" música para os meus ouvidos"

Nouvelle Vague (Vila Nova de Gaia)

Poderá "Love will tear us apart" tornar-se doce e exoticamente temperado? E terá "Killing moon" alguma coisa de pastoral? "Sim!" é a resposta cabal dos Nouvelle Vague. Depois de terem protagonizado um dos melhores momentos do último Sudoeste, os franceses regressam para dois concertos: actuam em Gaia a 13 de Outubro, descendo a Lisboa no dia seguinte.
Joy Division e Echo & The Bunnymen são apenas dois dos alvos das suas (re)visões. No disco de estreia homónimo, lançado em 2004, surpreenderam com um olhar transformador que não hesitava em pegar em nomes como Depeche Mode, Clash, Dead Kennedys, Cure ou Sisters Of Mercy. No novo trabalho, "Bande A Part", as "vítimas" foram Billy Idol, Blondie, New Order e Bauhaus, entre outros.
A ferramenta preferida de Olivier Libaux e Marc Collin (mentores do projecto) é a bossa nova, sem que isso desminta a presença de outras sonoridades (como o jazz).


Matthew Herbert (Porto)


Matthew Herbert é "só" um dos mais importantes nomes da reinvenção da música electrónica. O seu novo puzzle sonoro chama-se "Scale". É dele que partem as actuações marcadas para 18 de Outubro no Porto e para Lisboa no dia seguinte.
"Scale" sucede às aventuras sonoro-gastronómicas de "Plat du Jour". A (re)invenção e a (des)construção continuam a ser o prato do dia, mas de uma forma mais acessível. É um disco menos politizado e experimental, mas, em compensação, mais lúdico e confortável para o ouvido. Mais uma vez, não lhe escapa o aplauso da crítica. A BBC escreveu o seguinte sobre "Scale": "Quente e espirituoso. Agradavelmente bizarro. Sofisticado e tolo. Herbert no seu melhor".

Violent Femmes regressam a Portugal em Novembro

Os norte-americanos Violent Femmes actuam em Portugal nos dias 22 e 23 de Novembro, no Porto (no antigo cinema Batalha) e Lisboa (Coliseu dos Recreios).

O preço dos bilhetes para os espectáculos variam entre os 20 e 25 euros.


http://lazer.publico.clix.pt/artigo

quinta-feira, outubro 05, 2006

Um último adeus



Ausência

Eu deixarei que morra
em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado.
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne como nódoa do passado.
Eu deixarei... tu irás e encostarás a tua face em outra face.
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada.
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite.
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa.
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço.
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos pontos silenciosos.
Mas eu te possuirei como ninguém porque poderei partir.
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas.
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada.

Vinicius de Moraes

...e assim vejo-te partir e sussurro-te o meu último adeus...